Quem reflete em tudo
o que Montfort realizou nos poucos anos de sua vida sacerdotal, olha para ele
como para um gigante entre os santos. E, no entanto, vale também para ele o que
escreve dos servos de Maria, em sua obra-prima: O Tratado da Verdadeira Devoção
à Santíssima Virgem: “Se eles fazem alguma coisa exteriormente grande na
aparência, levam muito mais em consideração as que fazem interiormente, dentro
de si mesmos, em companhia de Nossa Senhora”.
Como já observamos, Montfort
manifestou-se, desde a mais tenra juventude, um filho modelar de Maria. Essa
devoção cresceu com os anos. Amou e serviu Nossa Senhora com toda a impetuosidade
de seu grande coração. As irmãs da Cruz de Saint Brieuc assim se exprimem: “Ele
tinha uma devoção tão grande a Nossa Senhora que nós considerávamos com que
estando no lugar de sua paixão dominante”. Resumindo, Montfort se situou entre
os mais eminentes servos e apóstolos de Maria que o Mundo conheceu.
Vivia em
Maria. Só assim se pode explicar que Montfort não tenha sucumbido nas terríveis
provações que encheram sua existência. É o segredo de sua felicidade no meio de
todas as contrariedades. “Senhor Jesus, exclama em seu “Tratado”, como são
amáveis vossos tabernáculos! O pássaro encontrou uma casa para si, e a
andorinha um ninho para seus filhotes. Oh! Como é feliz o homem que mora na
casa de Maria, onde fostes o primeiro a fazer vossa morada”.
E Maria vivia
nele. Confessava ele um dia, ao Pe. Blain, que Deus lhe tinha concedido uma
graça muito especial: a presença de Jesus e de Maria no mais íntimo de sua
alma. E a outra pessoa: que Maria lhe estava tão profundamente unida que não
podia mover-se nem agir “senão nela, por ele e para ela”.
Seu conhecimento
de Maria e seu amor por Ela se avivaram ainda mais pelas numerosas aparições
com que Nossa Senhora o honrou.
Em La-Garnache, um coroinha vai chamá-lo, e
não há resposta! Voltando, o menino conta que Montfort conversava com “uma bela
Senhora branca que estava no ar”.
Num outro dia, Montfort se atrasa para a
missa. Mandam um menino bater à porta de seu quarto. Mais uma vez não há
resposta. Olhando por uma fresta da porta, o menino vê uma senhora de branco,
irradiando luz, elevada acima do solo e conversando com o missionário. Quando
Montfort entra enfim na sacristia, o menino o acompanha com os olhos cheios de
admiração. O homem de Deus percebe e, tendo sabido a causa, diz-lhe: “Muito
bem, és feliz, tens o coração puro”. Depois, traçando em sua testa o sinal da
cruz, acrescenta: “Um dia irás ao céu”. O menino levou uma vida angélica, e
morreu pouco depois.
O fato seguinte mostra a santa familiaridade que
marcava as relações entre Montfort e Maria. Morreu o jumento que o acompanhava,
e que carregava os estandartes, quadros e imagens de que o homem de Deus se
servia nas missões. Ele compra outro por 33 escudos. Apresentando-se um pouco
mais tarde o comerciante para buscar seu dinheiro, encontra o missionário em
conversação com uma senhora, aureolada de luz. Retira-se e volta para casa. No
dia seguinte, seu cliente lhe explica que era Nossa Senhora que ele tinha
visto. O homem de Deus acrescenta que havia comprado o jumento caro demais,
pois a Virgem só lhe dera 30 escudos. Inútil dizer que o camponês tratou de não
regatear com Maria Santíssima!
O amor de Montfort por Maria se manifestava
de todas as maneiras. Trazia sempre consigo uma pequenina imagem da Virgem, a
qual no momento de sua morte ainda apertará entre as mãos. É com predileção que
chama Maria “sua boa Mãe”, e quando pronuncia estas palavras, fá-lo com tanta
ternura que involuntariamente as pessoas ficam emocionadas. Numerosos são os
cânticos que, nos momentos de lazer, compôs em honra de Maria. Esses poemas não
têm todos o mesmo valor literário, mas todos, sem exceção, permanecem
monumentos imperecíveis de seu culto por Maria, porque Montfort neles pôs toda
sua alma trasbordante de amor por ela.
As festas de Maria Santíssima são para ele verdadeiras
festas porque são dias especialmente consagrados a sua Mãe. Por nada deste
mundo ele deixaria passar esses dias sem celebrar a missa.
Dois anos antes
de sua morte, vai à diocese de Avranches no dia da Assunção. Pede ao bispo
autorização para celebrar a missa na Catedral e pregar na diocese. “Não só não
vos permito pregar em minha diocese, responde-lhe o prelado, mas vos proíbo
mesmo de aqui celebrar a missa; e o maior prazer que podeis fazer é retirar-vos
o mais depressa possível”. Montfort baixa a cabeça e vai-se embora. Fez nesse
dia o que nunca havia feito em sua vida. Pede um carro e antes do meio-dia
chega à diocese de Coutances. O pároco não tem grande confiança nesse
estrangeiro, mas ele mostra tão grande espírito de fé, um amor tão ardente por
Maria, que o sacerdote se tranqüiliza e lhe permite oferecer o Santo
Sacrifício.
Durante toda a vida ele mostra predileção pelos lugares de
peregrinação de Nossa Senhora. Quando vai a Roma, visita a pequena Casa de
Loreto. Fica como que em êxtase diante dessas paredes que abrigaram Maria
quando o anjo lhe anunciou a feliz nova, e onde ela envolveu o Filho de Deus
com a natureza humana. Cada dia, durante sua missa na Casa Santa, via-se sua
cabeça cercada de uma auréola. Decorreram quinze dias antes que conseguisse
decidir-se a prosseguir viagem para a Cidade Eterna.
Montfort nasceu orador.
O Pe. Vicente, Capuchinho, que trabalhou algum tempo com ele, coloca-o entre os
“maiores pregadores do século”. Ele narra: “Parecia-me ver um anjo ao ouvir falar
o Pe. de Montfort: sua fisionomia brilhava e irradiava seu amor ardente; a
língua não era mais do que o eco daquilo que o Espírito Santo lhe dizia ao
coração; a voz, os gestos, o exterior manifestavam a presença de Deus e sua
união com ele e diziam que o próprio Jesus Cristo falava por sua boca”.
Esta
eloquência atingia seu apogeu quando Montfort falava de Nossa Senhora. Um dos
temas preferidos de suas pregações mariais era a devoção ao rosário. O
Provincial dos Padres Dominicanos escreve a seu entrar na Confraria do Rosário
“uma infinidade de pessoas”.
Montfort estava sempre munido de um grande
terço, e era muitas vezes chamado “o Padre do terço grande”. Quando ele pregava
uma missão em alguma paróquia, seu primeiro cuidado era suspender na igreja 15
estandartes, representando os mistérios do rosário. Servia-se deles para
ensinar a devoção ao rosário. Todos os dias, em três momentos diferentes, fazia
recitarem-no. Nas paróquias onde trabalhara, legava, como uma relíquia
preciosa, a devoção ao terço.
O fato seguinte mostra qual era sua estima por
essa prática. Certo dia teve que passar pela paróquia de Vallet, onde pregara
uma missão de cinco anos antes. Pediram-lhe que se detivesse na localidade. “De
modo algum, replica o homem de Deus; eles abandonaram meu rosário”.
Montfort
atribuía a maior parte dos admiráveis frutos de suas missões ao rosário. “Nunca
disse ele, um pecador me resistiu, uma vez que o tenha conquistado com o
rosário”.
Nossa Senhora gostava de recompensar de vez em quando, de uma
maneira extraordinária, seu amor por essa oração. O bispo de La Rochelle tinha
pedido ao missionário que fosse pregar uma missão na ilha d’Yeu. Quando o homem
de Deus e seus companheiros quiseram embarcar, vieram adverti-los de que um
grande perigo os ameaçava. Os calvinistas da ilha haviam subornado piratas para
que atacassem o missionário. Esse não quis absolutamente levar em conta o aviso
e queria partir de qualquer modo, mas seus companheiros se recusaram. Foi
preciso esperar muito tempo uma nova ocasião. Nesse interim, um barqueiro se
oferece para levá-los à ilha. Quando chegam em alto-mar, percebem dois navios
de piratas que se dirigem diretamente a eles. “Estamos perdidos”, gritam todos
juntos. Só Montfort fica tranqüilo e entoa um dos seus cânticos. Ninguém tem
coragem de cantar com ele. “Pois bem, insiste o missionário, já que não podem
cantar, vamos recitar o rosário”. Dizem um primeiro terço. Voltando-se para
seus companheiros, Montfort lhe diz num tom calmo: “Não temam, meus amigos,
nossa boa Mãe, a Virgem Santíssima, nos atendeu; estamos fora de perigo!” “Fora
de perigo!”, replicam os marinheiros, “mas o inimigo está bem perto!” O grande
servo de Maria, porém, está certo do que diz. “Confiança! O vento vai mudar!”
Mal acaba de pronunciar essas palavras e os navios dos piratas são levados pelo
vento e se desviam rapidamente. O rosário os tinha salvo!
Eis agora um
prodígio na ordem da graça. Pelo fim de sua vida, Montfort embarca um dia para
Ruão. Seus companheiros de viagem não são absolutamente edificantes. Para matar
o tempo, têm conversas equívocas e cantam músicas inconvenientes. Finalmente, o
homem de Deus não suporta mais. Prende o crucifixo em seu bastão de viagem,
ajoelha-se e exclama: “Que todos os que amam Jesus Cristo o adorem comigo!”
Respondem-lhe com zombarias. “Rezemos o rosário”, diz Montfort ao irmão que o
acompanha. E, sob uma avalanche de chacotas, os dois homens, cabeça descoberta,
dizem o terço. Montfort se levanta então e convida os assistentes a rezar com
ele. Ninguém se move, mas as zombarias se tornam mais raras, quando o
missionário começa um segundo terço. Ao terceiro, todos estão de joelhos.
Dóceis como crianças, repetem aquelas palavras, há tanto tempo esquecidas. Tais
são as maravilhas que Montfort obtinha pelo rosário!